Construindo Parlamentos Aberto
Eduardo Seino
04 de junho de 2019 | 16h22
*Texto escrito em parceria com Renato Morgado, mestre em ciência ambiental (USP), especialista de democracia participativa (UFMG) e fellow em Governo Aberto junto a Organização dos Estados Americanos (OEA).
Em outra oportunidade[1], tratamos de iniciativas capazes de promover a transparência, incentivar o controle social e facilitar a prestação de contas das instituições democráticas. Na ocasião, argumentamos como estas ações surgem como possíveis respostas na tentativa de inverter o contexto de crise de confiança na democracia e nos atores políticos.
Em diversos países, a narrativa anticorrupção e antissistema, potencializada por meios tecnológicos de comunicação rápida, ampla e direta entre candidatos e a população, tem sido capturada por alguns atores e proporcionado espaço para práticas autoritárias.
Por outro lado, existe um campo emergente que entende que a crise democrática só tem uma solução: mais democracia. E é nessa linha que vem crescendo a difusão e a aplicação dos conceitos de Governo e de Parlamento Aberto, que podem ser entendidos como aqueles que criam e mantêm canais de participação, agem com transparência, proporcionam o acesso à informação e abertura de dados, prestam contas de suas ações e utilizam as tecnologias para melhor interagir com os seus cidadãos.
Especificamente em relação aos parlamentos, estes conceitos devem ser aplicados tanto às atividades legislativas, como a elaboração de leis, quanto às administrativas, que incluem os gastos realizados pela instituição e pelos parlamentares.
Criada em 2011, a Parceria para Governo Aberto[2] (do inglês, Open Government Partnership) é a iniciativa internacional de maior abrangência. Dela participam 76 países, que devem elaborar planos de ação com compromissos sobre o tema. A agenda de Parlamento Aberto é sempre debatida, inclusive constando nos planos de ação de muitos países.
Em nível regional, o ParlAméricas[3], rede de parlamentos das Américas e Caribe, tem um programa especifico de Parlamento Aberto, que busca fomentar a participação, a transparência e o uso de tecnologias pelos parlamentos. O próximo passo previsto pela rede é fomentar que os parlamentos elaborem os seus próprios planos de ação de abertura.
No Brasil, o conceito também está em processo de difusão. A Câmara dos Deputados e o Senado Federal têm apostado no uso de tecnologias para aprimorar a transparência e a participação. No Senado, o e-cidadania[4] é uma plataforma que permite a votação em projetos de lei e o envio de propostas legislativas que, se apoiadas por mais de 20 mil pessoas, são encaminhadas para a Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa (CDH). Já a Câmara, em especial por meio do LabHacker, possui diversos instrumentos, como o WikiLegis[5], que permite a participação na elaboração das leis, e o Parla[6], ferramenta que facilita a análise de discurso dos parlamentares.
Mas é no nível local que a aplicação da ideia de Parlamento Aberto se mostra ainda mais promissora, uma vez que a proximidade com os cidadãos é muito maior. Aqui vale destacar o caso de Piracicaba, município localizado no interior de São Paulo. Desde 2015, a Câmara de Vereadores aprimorou os seus instrumentos de transparência, criou um departamento responsável pelo tema e, em 2017, instituiu a Escola do Legislativo, que realiza aulas, cursos e oficinas de educação para a cidadania e a participação política. Em função destes avanços, o Observatório Cidadão de Piracicaba, iniciativa formada por uma rede de organizações locais, propôs que a Câmara incorporasse o conceito de Parlamento Aberto. Para que isso acontecesse, ao longo de 2018, a Câmara e o Observatório realizaram diversas atividades, incluindo palestras, oficinas, ações de comunicação e uma consulta pública, para coletar sugestões da população sobre como avançar nesta agenda.
Como resultado desse processo, no dia 22 de abril deste ano, a Câmara de Vereadores do município aprovou uma resolução que institui o Programa de Parlamento Aberto[7]. Trata-se de uma iniciativa pioneira no país. A resolução, além de institucionalizar o conceito de Parlamento Aberto, determina a elaboração de plano anuais sobre o tema, de relatórios semestrais sobre a sua execução e cria um Grupo de Trabalho interno, responsável por articular as ações.
A defesa da democracia e de seus valores fundamentais, como a transparência e a participação, não podem ficar apenas no plano do discurso. Somente ações concretas com capacidade de construir instituições mais fortes que trilhem um caminho de recuperação da confiança dos cidadãos devem ser consideradas como alternativa. Que as iniciativas evidenciadas acima inspirem e motivem os atores políticos, sobretudo, os legisladores desse país.
[1]https://politica.estadao.com.br/blogs/legis-ativo/em-busca-de-parlamentos-abertos/
[2] http://governoaberto.cgu.gov.br/a-ogp/
[3] http://www.parlamericas.org/pt/default.aspx
[4] https://www12.senado.leg.br/ecidadania
[5] https://edemocracia.camara.leg.br/wikilegis/
[6] https://parla.camara.leg.br/?initialDate=2019-01&endDate=2019-07
[7] http://siave.camarapiracicaba.sp.gov.br/Documentos/Documento/316664
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